domingo, 5 de agosto de 2007

Herdeira de Marco Polo... novo mundo 22



Se tivesse nascido no tempo do célebre genovês, aquele que foi Mestre do comércio, seria homem, de preferência, e um dos potenciais descendentes masculinos, do célebre chefe das caravanas mais romanescas da História.


Pensando bem, dizia para si própria, um homem deambula por todos os caminhos sem o mínimo dos constrangimentos. Confraterniza com todos os seres do planeta com o à vontade de um Deus. A mulher, fragilizada ou não pela maternidade, não se pode dar ao prazer do nomadismo. Mantém raízes profundas com os seus progenitores, irmãos, filhos, netos, como uma erva daninha encravada nas profundezas da Terra.


Qual dos dois é o maldito e o abençoado, interrogava-se Gilda, olhando a noite cair, através da janela do seu quarto. O céu estrelado em nada contribuía, naquele preciso momento para decifrar o enigma, nem sequer o abandono ou a magnificência, despertadas pela escuridão. Não era dor, não sentia alegria. O ar inodoro inflamava-lhe duramente as narinas como as brasas de uma lareira em chamas. O corpo poderia ser de pedra, mas o coração crescia-lhe como uma bola em permanente expansão.


Tiksey bateu levemente à porta, por duas vezes, chamando-a para descer para o jantar. Pela porta entreaberta conseguia ouvir o fervilhar dos convidados dispersos pelo salão, reunidos para ali celebrar o aniversário do avô paterno, o senhor Moren. Um homem rígido, educado na maior disciplina, de cuja magnanimidade dependia o futuro da sua neta Gilda.

Antes de descer, ainda deu uma nova olhada pela janela, observando ao longe o desfilar dos faróis dos veículos, que, ferozes, circulavam pela via rápida. A longa estrada distava cerca de cinco quilómetros da casa grande, mas a limpidez da noite permitia ainda assim imaginar algumas das aventuras nocturnas dos condutores.


Norton e Gema cantarolavam “Sna juja, Sna juja”… excertos de uma exótica música, de tonalidades asiáticas, passava na rádio, enquanto no seu convertível vermelho cor de cereja, os dois percorriam o caminho em direcção à casa do senhor Moren. Gilda, a irmã mais nova, e o avô eram os únicos indivíduos da festa que conheciam, mas anuíram ao convite para estar presentes na festa.


Talvez conseguissem diminuir a ansiedade de Gilda, que, dentro de dois dias partiria numa viagem sem regresso….Não sabemos onde iria desembocar no final do trajecto.



O senhor Moren, o patriarca da casa, deixara bem claro, que, como qualquer mulher sozinha, e de meia-idade, já não dispunha de muitas alternativas. Ela não era rainha, nem secretária, nem médica, nem casada, nem coisa nenhuma, argumentara o avô. Quando ouvira estas palavras, Gilda fechara os olhos muito.


Sentada num banco do jardim, imaginando-se um jovem, e não a tal mulher de meia-idade, por momentos, ainda acreditou ter o privilégio de ser mais um dos membros da prole, não do senhor Moren


mas de Marco Pólo.

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